A reunificação alemã é o nosso pecado original
Em frente à Porta de Brandemburgo, em Berlim, a 3 de outubro de 1990.
Trinta anos após a sua chegada ao poder, a 1 de outubro de 1982, e 22 anos depois da reunificação alemã, a 3 de outubro de 1990, a Alemanha celebra a herança de Helmut Kohl. Mas para Wolfgang Münchau, o chanceler da unificação alemã é também aquele que semeou os germes da atual crise europeia.
Ele está de volta, ali, na sala do grupo parlamentar da CDU-CSU do Bundestag [a 25 de setembro, numa das suas raras aparições públicas, por ocasião de uma cerimónia em sua honra]. Ele, um dos últimos grandes europeístas dos democratas-cristãos alemães, rodeado por um batalhão de eurocéticos que o aplaudem educadamente durante a sua visita ao Reichstag. Hoje, Helmut Kohl teme pelo seu grande sonho de unidade europeia. E tem razões para tal.
Grande amante de metáforas, Helmut Kohl nunca perde uma oportunidade de nos falar das duas faces da mesma moeda: a unidade da Alemanha e a unidade da Europa. A fórmula era cativante e é muito provável que também ele a tenha amado e tenha acreditado nela. No entanto, revelou-se falsa. A unidade alemã não tem no seu verso a unidade europeia mas sim a sua antítese. A reunificação alemã não é apenas uma das causas profundas da crise europeia como está, também, na origem da nossa incapacidade para dela sair. Esta é, de facto, a tragédia do antigo chanceler: a realização da sua grande obra política (a reunificação alemã) trouxe dentro de si a destruição do seu maior sonho político (a unidade europeia).
A reunificação precipitada da Alemanha custou cerca de dois biliões de euros de transferências sociais. É o melhor exemplo do mundo de má gestão económica. Um recorde prestes a ser batido pelo desastre europeu. Como podemos ficar surpreendidos por os cidadãos alemães que já tiveram (e ainda têm) de pagar a reunificação, recusarem agora continuar a meter a mão no bolso para pagarem a Europa?
Renovação institucional da União Europeia
Estou absolutamente convencido de que a antiga República Federal, não reunificada, teria sabido gerir melhor a crise do euro. Teríamos uma união bancária e financeira e a dívida da Grécia teria sido perdoada. A integração europeia era a razão de ser última da antiga República Federal. A crise teria sido a oportunidade de uma renovação institucional da União Europeia.
Em vez da união europeia, procedemos à união nacional. Mudámos de capital e, ao mesmo tempo, de cultura política, ficando mais próximo de Moscovo do que de Bruxelas, Paris ou Londres. Lembro-me da resposta que me foi dada, há alguns anos, por um deputado e alto responsável da CDU quando o interroguei sobre a coordenação das políticas económicas no espaço europeu: a Alemanha não coopera ao nível europeu mas sim ao nível do G-20, os vinte países mais industrializados do mundo. A Alemanha já não se considera como um membro da União Europeia mas sim como uma potência autónoma, que trata de igual para igual com os americanos, os russos e os chineses sem se preocupar com pequenos importunos como os Estados europeus.
Como chegámos aqui? A reunificação alemã escamoteou um parâmetro fundamental da dinâmica europeia que repousava sobre os cinco maiores países-membros (Alemanha Ocidental, França, Reino Unido, Itália e Espanha). Não é por acaso que os britânicos, depois da reunificação da Alemanha, perderam todo o interesse no projeto europeu. E o descomprometimento progressivo do Reino Unido só agravou ainda mais esse desequilíbrio.
Duas faces da mesma moeda
A Alemanha representa hoje mais de um quarto do poder económico europeu mas tem repugnância em assumir um papel de líder que nunca quis ter na Europa. Parceiro como os outros, a antiga república Federal ter-se-ia portado como hoje faz a Holanda, ou seja, de maneira crítica mas construtiva.
Devo admitir que, durante muito tempo, fiz parte daqueles que acreditaram na metáfora de Kohl sobre as duas faces da mesma moeda. No início dos anos de 1990, era inconcebível que, um dia, a Alemanha se pudesse desligar do consenso pró-europeu. Este afastamento deu-se, em parte, com a chegada de responsáveis políticos da Alemanha de Leste, como Angela Merkel, que não têm ligações pessoais com o projeto europeu e voltaram as costas à integração europeia.
Mas a reintegração da ex-Alemanha de Leste, no entanto, não chega para explicar esta evolução. As prioridades também mudaram no ocidente do país. Uma das razões é económica. Por causa do peso da reunificação, a Alemanha adotou uma moeda única com uma cotação sobrevalorizada. Resultado, durante dez anos, a política económica da Alemanha consistiu em aumentar a sua competitividade em vez de tentar reforçar a produtividade no conjunto do espaço europeu. E esta é uma das principais causas da atual crise.
A reunificação da Alemanha e a união da Europa não andam lado a lado, cada uma delas tem os seus próprios problemas económicos. Os futuros historiadores terão, penso eu, um olhar mais crítico sobre a reunificação e os méritos do chanceler Kohl do que atualmente acontece.
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