segunda-feira, 30 de julho de 2012

O fantasma do corte dos salários



Quando a Grécia entrou para a zona euro, 90 fábricas operavam num parque industrial desta cidade costeira. Agora apenas 26 estão ativas.

O declínio industrial da planície litorânea no norte da Grécia explica como a moeda comum agravou os problemas econômicos de países do sul da Europa, e mostra por que as cúpulas de emergência de líderes políticos não podem sozinhas resolver a crise de região.

A Grécia, como outros membros da União Europeia que agora precisam de ajuda financeira, lutou para competir no mercado europeu e global à medida que o crédito barato e problemas estruturais inflacionavam os preços e salários mais rápido do que seu leque de produtos pudesse justificar. Agora, sem uma moeda nacional para desvalorizar e tornar suas exportações mais baratas, o país não tem escolha a não ser embarcar numa desgastante "desvalorização interna" que derrubará salários e preços.

"Quando nós nos unimos à Europa, graças à moeda única, muitos pensaram que éramos todos uma única economia", diz Dimitris Petsas, cuja fábrica de roupa íntima é uma das poucas sobreviventes em Komotini. "Nós esquecemos que temos que exportar ativamente para trazer os euros da Alemanha e Europa Central para a Grécia." Em vez disso, disse ele, "os países centrais nos deixaram sem nada".

Petsas está pressionando seus trabalhadores a aceitar reduções salariais de até 30% para ajudar a empresa a cortar custos e revitalizar suas exportações de camisetas e cuecas para a Alemanha, em meio à crescente concorrência da China e da Índia. O problema, diz o empregador de 60 anos, é que "a maioria dos funcionários tem obrigações, hipotecas, empréstimos de carro e se eu pagar menos, eles não poderão sobreviver".

Grécia, Espanha, Portugal e Itália enfrentam o mesmo caminho difícil para a recuperação seguido pela empresa de Petsas. Eles precisam reduzir os salários e os preços, ao mesmo tempo em que trabalham para pagar suas dívidas públicas e privadas.

O novo governo grego está à procura de novos cortes de gastos antes de uma visita de inspetores da União Europeia, do Fundo Monetário Internacional e do Banco Central Europeu a Atenas esta semana. Espera-se também que as autoridades anunciem a fusão ou o fechamento de cerca de 20 agências governamentais.

Nas economias desenvolvidas, os salários tendem a cair somente através de uma recessão prolongada e desemprego elevado e, mesmo assim, isso só ocorre muito lentamente. Na Grécia, os protestos contra este empobrecimento gradual levaram o país à beira da ingovernabilidade.

Como se isso não bastasse, quanto mais a renda cai e a economia encolhe em países em crise, menor é a confiança do mercado na sua capacidade de pagar, resultando em um aumento da fuga de capitais dos bancos e dos mercados de títulos de dívida soberana.

Caso a zona do euro termine se desintegrando, a razão mais profunda não será a falta de disciplina fiscal ou tensões políticas. Será porque a adesão ao euro por países em dificuldade, juntamente com a abordagem da Alemanha com relação a sua própria economia, os colocam numa rota de recuperação que alguns economistas consideram ser social, política e financeiramente quase impossível.

Assim, o ônus do ajuste recai principalmente sobre o endividado sul da Europa e trabalhadores como Koutsoula Voula, uma operária de 50 anos que trabalha há 28 na fábrica de Petsas. Seu salário caiu para um nível que mal dá para pagar a hipoteca e ela teme novos cortes. "Quanto mais? Como vou pagar as contas?", pergunta ela, lamentando que "não existe outro emprego".

Koutsoula e o marido, um professor aposentado, cuja pensão foi drasticamente reduzida, têm um plano de contingência: se sua renda continuar a cair, vão vender o imóvel onde moram e passarão a ser agricultores de subsistência no terreno de menos de meio hectare que têm na zona rural perto do mar, onde cultivam tomates e pêssegos e criam coelhos.

As empresas e os sindicatos que lutam contra as reduções salariais na Grécia argumentam que elas reverteriam uma longa espiral inflacionária. Os sindicatos estão ameaçando uma nova onda de greves que pode reacender as grandes manifestações que abalaram a política do país antes das tumultuadas eleições em maio e junho.

Em fevereiro, os principais credores da Grécia, juntos com o FMI e a UE, forçaram o governo a reduzir o salário mínimo nacional em 22% e, no caso dos jovens, até 32%.

O FMI e a UE estavam frustrados pela lentidão com que os salários gregos caíam, embora o desemprego estivesse em torno de 22%. As duras medidas de austeridade reforçaram o apoio dos eleitores aos partidos que se opõem ao rígido resgate internacional.

Como outros trabalhadores de um resort turístico de luxo financeiramente abalado em Porto Carras, na península de Halkidiki, no norte da Grécia, o supervisor de casino Giorgos Toumpas trabalha meio período, porque o negócio vai mal. Sua renda mensal, que costumava ser de 1.200 euros depois de impostos, caiu. "Nós estamos derramando sangue para manter o negócio vivo", lamenta o trabalhador, que é líder sindical dos empregados da indústria do turismo. "Quanto mais sangue eles querem?".

Toumpas acumula vários meses de atraso nos pagamentos da hipoteca, mas disse ao banco que espera pôr tudo em dia neste verão, quando esperava trabalhar mais horas. "O banco concordou", disse ele. "Mas o que mais eles podem fazer? Se eles tomarem todas as casas da Grécia, para quem eles vão vendê-las?". Os novos cortes deixarão a ele e à sua esposa, que é caixa em um dos restaurantes do resort, numa situação ainda mais precária. "Não vejo futuro neste lugar", diz ele.

Os salários na maior parte da economia grega diminuíram um pouco desde o início da recessão no fim de 2008. Mas de acordo com a UE e o FMI, a desvalorização interna tem um longo caminho pela frente antes de a Grécia ser suficientemente competitiva para iniciar uma recuperação liderada pelas exportações.

As estimativas de quanto aos preços devem cair na periferia da zona euro em relação aos membros mais fortes variam. Economistas estimam que Grécia e Portugal enfrentam o maior desafio, enquanto que Espanha e Itália precisam de ajustes menores, mas igualmente dolorosos.

Para Petsas, o fabricante de roupas íntimas, a vida na zona do euro tornou-se uma luta entre os países para ver quem consegue atrair mais euros um do outro.

O fim do crédito fácil significa que os gregos não têm escolha a não ser exportar mais e importar menos. Isso não deixa outra escolha a não ser reduzir os salários, diz ele. "Se quisermos que as nossas fábricas continuem aqui, isso tem que mudar".



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