Artigo publicado no Instituto Mises Brasil.
Por Frank Karsten
Embora quase todos os países
democráticos sofram com governos inchados, excesso de regulamentação, altos
impostos e uma enorme dívida pública, poucas pessoas conseguem vislumbrar a
relação causal entre estes problemas e o próprio sistema democrático. Para
a maioria, a solução para estes problemas é mais democracia, e não menos.
Muitos ainda acreditam que
democracia corresponde a prosperidade, igualdade, justiça, união e liberdade.
Mas não há nenhuma evidência de nada disso. A democracia se apoia em três
princípios fundamentais: você tem o direito de votar, você tem o direito de concorrer
a um cargo público, e a maioria decide. E só. Em nenhum lugar está
escrito, por exemplo, que a democracia garante o direito à liberdade de
expressão, um direito que muitas pessoas associam à democracia. Nem há
qualquer explicação lógica que mostre por que a democracia tende a gerar
prosperidade.
As pessoas simplesmente aceitam
como verdade absoluta o senso comum que diz que a democracia gera todas estas
benesses. A verdade, no entanto, é exatamente oposta a este senso
comum. Os próprios princípios da democracia dão origem a processos que
conduzem a sociedade para o oposto da liberdade e da prosperidade.
Os processos mais importantes são
os seguintes.
1) Comportamento
imediatista
Como Hans-Hermann Hoppe explicou em seu livro Democracia,
o Deus que falhou — a democracia inevitavelmente gera uma preferência
temporal alta — isto é, leva a um comportamento imediatista, míope, visando
apenas ao curto — tanto entre os governantes como entre os cidadãos. Dado
que os políticos democraticamente eleitos ficarão apenas temporariamente no
cargo, e eles não são os proprietários dos recursos à sua disposição, eles
serão acometidos de um irrefreável incentivo para gastar dinheiro público em
projetos que os tornem populares, desconsiderando as consequências futuras de
tal ato. Os problemas que eles criam ao longo do caminho, como o forte
aumento da dívida pública, serão deixados para que seus sucessores resolvam.
Uma sociedade democrática é como um carro alugado — ou pior: um carro que
é não propriedade de ninguém e utilizado por todos. Ela rapidamente se
destrói.
2) Conflito social e
parasitismo
Democracia é um sistema em que as
pessoas votam naqueles políticos que elas creem que irão favorecê-las com
benesses e privilégios, de modo que a conta seja entregue a outras pessoas.
A democracia, portanto, inerentemente faz com que haja um imediato
conflito grupal: os agricultores contra os moradores urbanos, os idosos contra
os jovens, os imigrantes contra os residentes, empregadores contra empregados
etc. Isso gera um comportamento parasitário e tensões sociais.
Este é o resultado do princípio
democrático que preconiza que todas as decisões importantes devem estar
sujeitas à vontade da maioria, ou seja, devem ser decididas pelo estado, o que
transforma todos os indivíduos em meras engrenagens de um sistema político
coletivista. Em uma sociedade livre, baseada em direitos individuais,
indivíduos com diferentes visões e objetivos não se tornam potenciais inimigos
mútuos. Eles podem colaborar entre si, comercializar uns com os outros,
ou simplesmente se isolar e não se intrometer na vida de ninguém — mas eles
certamente não terão meios coercivos com os quais obrigar outros cidadãos a satisfazer
seus próprios fins.
A democracia cria uma discórdia
que não existiria em uma sociedade livre. Indivíduos não se importam se o
sujeito que lhes vende uma xícara de café em uma padaria é judeu, católico,
protestante, muçulmano, ateu, branco, preto, solteiro, casado, gay, hétero,
velho, jovem, nativo, imigrante, alcoólatra, abstêmio ou qualquer outra
coisa. Nada disso importa no curso de sua interatividade diária com as
pessoas. Por meio do comércio e da cooperação, cada pessoa ajuda as outras
a alcançar suas aspirações. Se alguém diferente de você se muda para a
sua vizinhança, você fará o seu melhor para lidar bem com ele. Seja na
igreja, no shopping, na academia ou até mesmo casualmente nas ruas, nós sempre
nos esforçamos para encontrar maneiras de sermos civis e prestativos.
Agora, coloque estas mesmas
pessoas na arena política e elas imediatamente se tornam inimigas. Porquê?
A política não é cooperativa, como o mercado; ela é exploradora. O
sistema é configurado para ameaçar a identidade e as opções dos outros.
Todo mundo deve batalhar para impor as suas preferências. Consequentemente,
coligações se formam, bem como alianças espúrias e momentâneas, que
constantemente se alteram. Este é o mundo imoral em que o estado — por
meio da máquina eleitoral — nos joga. Nele, torcemos para que o nosso escolhido
vença e desejamos a morte política do oponente.
O jogo democrático confunde as
pessoas em relação ao real inimigo. O estado é a instituição que gera e
vive à custa destas divisões. No entanto, as pessoas são distraídas deste
fato por causa do endeusamento do sistema. Os negros culpam os brancos,
os homens culpam as mulheres, os héteros culpam os gays, os pobres culpam os
ricos e assim vai, em um infinito número de combinações possíveis.
O resultado final é a destruição
dos cidadãos, e uma vida próspera para a elite política.
3) Intromissão
Embora muitas pessoas associem
democracia a liberdade, o fato é que nenhuma liberdade está segura em uma
democracia. Se a maioria (ou, muitas vezes, alguns pequenos grupos
influentes) quiser, ela poderá intervir em qualquer tipo de ação, transação ou
relacionamento voluntários — e é isso que ela faz. Ela proíbe as pessoas
de beber álcool em determinadas circunstâncias, de queimar bandeiras, de se
manifestar contra as guerras, de assistir a determinados filmes, de
"discriminar" e assim por diante. Os governos democráticos
continuamente intervêm em transações voluntárias entre vendedores e
compradores, empregadores e empregados, professores e alunos, médicos e pacientes,
inquilinos e proprietários, prestadores de serviços e clientes etc. Eles
também se intrometem nas escolhas pessoais: a sua escolha de fumar, de usar
drogas, de se envolver em profissões específicas (para as quais você não possui
uma "licença"), de "discriminar" (isto é, de escolher com
quem você quer se associar), de criar produtos específicos (para os quais
existe uma 'patente', isto é, um monopólio do governo) etc. Não há
limites para esta intromissão. A pouca liberdade que ainda temos nas sociedades
ocidentais não se deve à democracia, mas sim à nossa tradição de amor à
liberdade.
4) Coletivismo e
passividade
Nos tempos pré-democráticos, a
tendência era a de os governados não confiarem nos governantes, e cada novo
imposto criado era visto como uma violação à liberdade. Porém,
atualmente, as decisões democráticas são vistas como fundamentalmente
legítimas, pois, de acordo com o senso comum, tais decisões foram supostamente
tomadas pelas próprias pessoas.
Durante as eras monárquicas,
poucos nutriam a esperança de chegar ao poder; consequentemente, a maioria
suspeitava de todos aqueles que estavam no poder. Já a democracia, por
outro lado, permite, ao menos na teoria, que todos possam chegar ao poder.
Isto faz com que as pessoas acreditem que elas devam se submeter à regra
da maioria. Elas podem não concordar com leis e regulamentos específicos, mas
elas sentem que devem cumpri-los. Mas, naturalmente, elas tentarão eleger
um partido específico que crie leis que as beneficiem e que faça com que o
dinheiro distribuído pela máquina estatal flua na direção delas. Foi
assim os gastos estatais cresceram, na maioria dos países democráticos, de
cerca de 10% do PIB antes da Primeira Guerra Mundial para os quase 50% atuais.
É também por isso que temos tantas leis atualmente, de modo que podemos
dizer com total segurança que há uma lei específica para absolutamente tudo que
existe.
Gasto público, % PIB
5) Corrupção e abuso
Embora a governação da maioria
seja suficientemente má por si só, a realidade de uma democracia é muito mais
sórdida. Dado que o governo eleito tem poder virtualmente ilimitado e
controla praticamente todos os recursos da sociedade, todos os tipos de grupos
de interesses e lobies irão trabalhar nos bastidores para influenciar o governo
a criar e modificar leis para seu proveito próprio. Um exemplo óbvio são
os bancos e os interesses financeiros que, em conjunto com o governo, criaram
um sistema de papel-moeda o qual eles controlam e manipulam para seu próprio
benefício.
Mas há também vários outros
interesses poderosos que utilizam o sistema para proveito próprio e em
detrimento do resto do povo: sindicatos, ONGs, empresas farmacêuticas,
produtores rurais, empresas telefônicas, aéreas, de comunicação etc. Os
cidadãos comuns não podem fazer quase nada à respeito. Eles geralmente
não têm os meios ou o tempo para descobrir e
entender o que está a acontecer. Tudo o que podem fazer é votar de vez em
quando, mas eles não têm como responsabilizar seus governantes ? por suas
ações.
Portanto, as nossas mazelas
econômicas e sociais não decorrem do fato que "os políticos errados estão
no poder". É o próprio sistema democrático quem causa os problemas.
O que realmente deve ser feito é mudar o sistema para que ele se torne menos democrático,
e não mais. E a forma mais importante e eficaz de fazer isso é retirando
poderes do governo e descentralizando ao máximo todos os processos de tomada de
decisão.
Frank Karsten é
o fundador da More Freedom Foundation na Holanda. Junto com Karel
Beckman, ele escreveu Beyond Democracy: Why democracy
does not lead to solidarity, prosperity and liberty but to social conflict,
runaway spending and a tyrannical government (Além da democracia: por que a democracia não
conduz à solidariedade, à prosperidade e à liberdade, mas sim a conflitos
sociais, gastos exagerados e tirania governamental). Este novo
livro libertário derruba treze grandes mitos sobre os quais a democracia é normalmente
defendida. O livro mostra também uma alternativa: uma sociedade baseada
totalmente na liberdade individual e em relações sociais voluntárias. Veja mais em
em beyonddemocracy.net
Sem comentários:
Enviar um comentário